Acervo com mais de 1700 itens do jornalista foi lançado na última sexta com transmissão ao vivo nas redes sociais do Instituto Vladimir Herzog
Por Débora Rocha, do Instituto Vladimir Herzog
Na última sexta-feira, dia 26 de junho, às 19h, o Instituto Vladimir Herzog (IVH) realizou o lançamento virtual do Acervo Vladimir Herzog em comemoração aos 83 anos de vida do jornalista, através da transmissão ao vivo “Acervo Vladimir Herzog: vida e memória em defesa da democracia”, com a participação de Bianca Santana, Ivo Herzog, Luis Ludmer e Rogério Sottili. O Acervo, que apresenta mais de 1700 itens digitalizados sobre a trajetória pessoal e profissional do intelectual, é parte de um esforço institucional em preencher uma lacuna histórica, construindo uma Memória sobre Vlado que vá além de seu trágico assassinato pelo aparelho repressivo da ditadura militar, em outubro de 1975, e evidencie sua história de luta em vida a favor dos Direitos Humanos e da construção de um projeto de país mais justo.
O futuro pode ressignificar o passado, e é preciso conhecê-lo para romper com os ciclos de violência que se perpetuaram em nossa história. Foi neste sentido que Rogério Sottili, diretor executivo do Instituto Vladimir Herzog, apresentou durante a transmissão a missão institucional do IVH, com especial destaque à luta por Memória, Verdade e Justiça, mas também expondo os demais projetos das áreas de Educação em Direitos Humanos e também de Jornalismo e Liberdade de Expressão. Ele ressaltou que o lançamento do Acervo, no atual panorama político brasileiro, é uma grande conquista para a sociedade brasileira e uma importante sinalização do IVH, que pretende fazer deste Acervo um espaço digital de resistência às iniciativas que negam a história do Brasil. Sottili concluiu reafirmando o desejo da instituição na batalha contra a violência de Estado: “Queremos que esse acervo digital seja um ponto de resistência, de luta, contra todos os abusos cometidos pela Ditadura Militar do passado e que o Estado continua cometendo hoje”.
Em outro recorte, Ivo Herzog, presidente do Conselho do Instituto e filho de Vladimir Herzog, relembrou uma história pessoal em uma das falas mais inspiradoras acerca da importância do Acervo. “Já vi estudantes falando sobre a morte do meu pai, fazendo uma instalação na escola, ficarem emocionados e virem chorando dizer que a história do meu pai mostra como as coisas são possíveis, como a gente pode fazer uma diferença no mundo”. E completou: “Eu espero que agora a vida dele também inspire essas pessoas de que a gente não precisa morrer para mudar o mundo, que a gente, vivo, tem uma capacidade muito maior de tornar essa sociedade, esse mundo, melhor”.
O Acervo Vladimir Herzog, composto por reportagens, fotografias, correspondências e outros materiais, reunidos tanto pela família Herzog ao longo de quarenta anos quanto por outros mais de 20 acervos públicos e privados, é um projeto do IVH com apoio do Itaú Cultural e teve sua coordenação técnica elaborada por Luis Ludmer. O coordenador destacou na live algumas das peculiaridades da vida de Vlado que foram descobertas durante a pesquisa, como a sua participação intensa na juventude em grupos de teatro amador, assim como seu amor por animais e seu obsessivo rigor com os textos na função de editor. Ainda sobre a rica produção intelectual e profissional de Herzog, disse: “Eu só sinto o quanto ela dialoga com o país hoje”.
Além disso, Ludmer aproveitou a oportunidade para um chamamento público, convidando todos que possuem arquivos e materiais relacionados à vida e à obra de Vladimir Herzog que entrem em contato com o Acervo, que está pronto, mas precisa ser um conjunto de arquivos vivo e dinâmico. O coordenador técnico do Acervo ressaltou ainda a importância da parceria institucional com o Museu da Pessoa para a construção da coleção “Amigos do Vlado”, série de 12 vídeos exclusivos com depoimentos de amigos e familiares do jornalista que consta no acervo.
Com uma participação preciosa, a jornalista, escritora e professora de jornalismo Bianca Santana avaliou a atualidade das pautas e críticas de Herzog, que pautou temáticas como a Semana Afro-Brasileira de 1974, a privatização da educação e os usos do rádio e da televisão para processos educacionais, com as problemáticas de acesso que são intrínsecas à realidade social brasileira. Sobre isso, apontou que: “Fiquei pensando como uma boa reportagem permite, a partir de um dado, de um fato ou de um cenário específico, fazer reflexões que são universais, que são atemporais, e que servem para a gente pensar de fato presente e futuro”. Quando perguntada sobre a importância do material para o ensino e estudo do jornalismo, Bianca respondeu que o material é valiosíssimo, e que, além de permitir a compreensão do ofício, traz a dimensão do jornalismo como um trabalho coletivo.
Encaminhando para o encerramento, a mediadora da transmissão Marcela Lisboa, coordenadora do projeto Usina de Valores do IVH, relembrou a frase da cineasta Carmen Luz: “O futuro lançou sua flecha. O que dirão teus olhos?”, e questionou os participantes sobre o que dirão nossos olhos diante deste tempo. Bianca Santana ofereceu como resposta uma lembrança da figura do orixá Exu, “que com a flecha que atira hoje, mata o pássaro ontem”. “Esse acervo remete para mim essa noção de temporalidade, que se mistura e que não é linear. […] A obra do Vlado nos permite reconstituir quem nós somos”, concluiu a jornalista.
Vlado, presente!