Considerar os acúmulos no tema é fundamental para compreendermos as complexidades de um problema tão urgente.
O Instituto Vladimir Herzog vem a público manifestar que está acompanhando de forma atenta as medidas anunciadas pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública – entre elas a proposta de regulamentação das plataformas digitais – para combater as insistentes tentativas de golpe que o Brasil tem sofrido nos últimos anos.
Reconhecemos e valorizamos os esforços da Justiça e de diferentes áreas do atual governo para fazer com que os atos golpistas que escandalizaram o país no dia 8 de janeiro não fiquem impunes. Entendemos, no entanto, que o enfrentamento real e consistente de um problema tão complexo quanto a desinformação exige mudanças estruturais. Nesse sentido, diferentes setores da comunidade, inclusive organizações da sociedade civil organizada, estão, há anos, produzindo conhecimento e propondo soluções para os múltiplos aspectos da vida democrática que são impactados pelo cenário atual.
Não são poucas as amostras nesse sentido. No ano passado, por exemplo, dezenas de organizações – entre elas o Instituto Vladimir Herzog – se reuniram para transformar a inteligência consolidada no combate à desinformação em propostas para que as plataformas tomassem providências concretas a fim de garantir a integridade do processo eleitoral. A iniciativa, chamada “Democracia Pede Socorro”, envolveu ainda reuniões com representantes de diversas dessas empresas e o monitoramento de tudo que efetivamente foi feito. O balanço de todas essas atividades está disponível no site do projeto.
Não há dúvidas de que a atuação das plataformas digitais precisa ser regulamentada. Essa, inclusive, é uma necessidade global e imperativa para a consolidação de regimes democráticos que estão sendo ameaçados em todo o mundo.
Como se não bastasse, não podemos ignorar que, mesmo em países com leis e sistemas judiciários robustos, a desinformação tem servido como base para que setores extremistas e reacionários da sociedade insistam em tentativas de corroer as estruturas do Estado Democrático – entre elas a atuação da imprensa -, por meio de ataques sistemáticos a jornalistas e comunicadores em todo o país. Ou seja, trata-se de um problema que, em casos mais graves, atenta contra a integridade de cidadãos brasileiros que, nesse caso, exercem um papel fundamental para o bom funcionamento do regime democrático.
Sendo assim, por se tratar de um tema tão complexo e delicado, as soluções propostas devem sim ser céleres e concretas, mas precisam obrigatoriamente ser estruturais; e não apenas atender demandas momentâneas. Mais do que isso: não podem desprezar o conhecimento produzido e compartilhado por um campo que está intensamente mobilizado em defesa da liberdade de expressão e da construção de um ambiente comunicacional mais plural e democrático.
É imperativo, portanto, que o Estado desenvolva formas de agir no sentido de garantir que todos respeitem os valores éticos e estruturantes da democracia, e o melhor caminho para isso é se utilizar da inteligência produzida pelos diversos setores da sociedade preocupados em construir um país socialmente mais justo, plural e democrático, afinal, não existem soluções fáceis.