O Instituto Vladimir Herzog vem a público manifestar seu estarrecimento pela confirmação das informações de que o ex-presidente Ernesto Geisel aprovou a continuidade de uma política de execuções sumárias daqueles que ousavam se manifestar contra a ditadura militar que aterrorizou o Brasil entre 1964 e 1985.
O documento, liberado agora pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos, ainda afirma que Geisel teria orientado o então chefe do SNI (Serviço Nacional de Informações) que viria a substituí-lo na Presidência, João Baptista Figueiredo, a autorizar pessoalmente os assassinatos.
Apesar de não haver nenhuma surpresa, essa é mais uma prova de que não houve porões da ditadura; e sim uma política de Estado de terror, desaparecimentos forçados e assassinatos.
Tais informações reforçam de maneira incontestável as conclusões e as recomendações do relatório final da Comissão Nacional da Verdade, publicado em dezembro de 2014, especialmente no que diz respeito à imprescindibilidade de reinterpretação da Lei nº 6.683 – a Lei da Anistia.
A anistia concedida a agentes públicos que ordenaram detenções ilegais e arbitrárias, torturas, execuções, desaparecimentos forçados e ocultação de cadáveres – como o documento do Departamento de Estado dos Estados Unidos atesta – é incompatível com o direito brasileiro e a ordem jurídica internacional, pois tais crimes, dadas a escala e a sistematicidade com que foram cometidos, constituem crimes contra a humanidade, imprescritíveis e não passíveis de anistia.
Desta forma, torna-se urgente a reinterpretação dessa lei, uma vez que, da forma em que está estabelecida, ela perpetua a impunidade, propicia uma injustiça continuada, impedindo às vítimas e a seus familiares o acesso à justiça, e afronta o dever do Estado de investigar, processar, julgar e reparar as gravíssimas e generalizadas violações de direitos humanos cometidas durante a ditadura militar.
Além disso, diante dos novos fatos, torna-se inaceitável a explicação, que até hoje tem sido adotada pelas Forças Armadas, de que tais violações se constituíram em alguns poucos atos isolados ou excessos, gerados pelo voluntarismo de alguns militares.
É imperativo, portanto, além da reinterpretação da Lei da Anistia, o reconhecimento, de modo claro e direto, da responsabilidade institucional das Forças Armadas por esse quadro terrível para que o Brasil possa, efetivamente, promover as mudanças que precisa para garantir a todos seus cidadãos o direito à verdade e à justiça e fortalecer seu Estado democrático de direito.
Instituto Vladimir Herzog
11 de maio de 2018