Comissão da Verdade e Memória da UFSC, criada no final de 2014, investigou a atuação do aparato repressivo dentro da universidade durante os anos de ditadura
por Ana Helena Rodrigues
Os atos de repressão e violência que afetaram todos os setores da sociedade brasileira durante o período de ditadura militar começaram a ser apurados oficialmente a partir da de maio de 2012, pela Comissão Nacional da Verdade (CNV), criada pelo Congresso Nacional através da Lei 12.528/2011. Dada a grande extensão do território nacional, a CNV sugeriu a criação de comissões similares em nível estadual para reforçar as investigações. Da pesquisa realizada pela Comissão Estadual da Verdade Paulo Stuart Wright, no estado de Santa Catarina, surgiu a necessidade da formação de uma comissão para investigar especificamente os ocorridos na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
A Comissão de Memória e Verdade da UFSC (CMV-UFSC), criada em dezembro de 2014 pelo Conselho Universitário, apurou e identificou as violações dos direitos humanos que atingiram a comunidade universitária no período de 1º de abril de 1964 a 5 de outubro de 1988. Por mais de três anos, a Comissão realizou pesquisas em acervos de Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Brasília, colheu 21 depoimentos de pessoas que viveram o período ditatorial na instituição e realizou três audiências públicas com 13 depoentes ao todo. O resultado de todo esse trabalho se encontra no Relatório Final, disponibilizado no site do Acervo de Memória e Direitos Humanos da universidade.
Inicialmente prevista para ter a duração de um ano, a Comissão teve a sua vigência prorrogada devido à abrangência das atividades previstas e, diante da riqueza das fontes encontradas, da possibilidade de expansão da pesquisa. “Uma investigação instiga outra, e o que se sabia torna-se ínfimo se comparado ao tanto que resta por saber”, conta Rachel Abrão, estudante de Ciências Sociais que contribuiu com a CMV-UFSC. “A criação da comissão proporcionou muito mais do que uma conexão entre política, memória e história, proporcionou conhecimento, pesquisa, reconhecimento e a busca incansável pela justiça.”
A partir da análise de documentos do Serviço Nacional de Informação (SNI) e do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), a Comissão constatou a colaboração direta da administração da UFSC com órgãos do Exército, através dos reitores e servidores públicos do alto escalão que repassaram ao governo, durante todo o regime militar, informações sobre pessoas consideradas subversivas. Em 1972 a repressão se tornou mais forte na tentativa de conter o aumento dos movimentos de resistência. Para isso, a UFSC criou um órgão interno específico para vigilância da população universitária, a chamada Assessoria de Segurança e Informação (ASI) que fazia o trabalho de vigiar o movimento estudantil e a atuação dos docentes.
Para Rachel, uma parcela da população brasileira se dizer hoje em dia saudosista da ditadura reflete a falta de conhecimento sobre nosso próprio passado. Em referência à queima de livros promovida depois do golpe civil-militar de 1964, a estudante conclui: “Penso que, se não mantivermos uma constante reflexão sobre nosso passado, as cruéis imagens do museu em chamas poderão espalhar fagulhas por toda sociedade, repetindo uma vez mais a barbárie de um estado desumano.”
Para saber mais sobre a Comissão de Memória e Verdade da UFSC:
* Entrega do Relatório Final da Comissão de Memória e Verdade da UFSC:
* Acervo de Memória e Direitos Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina: https://www.memoriaedireitoshumanos.ufsc.br
* Inauguração da placa em homenagem aos estudantes da UFSC presos no Congresso de Ibiúna de 1968:
https://www.youtube.com/watch?v=fxyJc_eVV1Q