Quantos episódios de graves violações de direitos humanos constituem a história do Brasil? Quantos deles foram perpetrados pelo próprio Estado brasileiro? Na campanha “Responsabilização Já! Sem Impunidade” o Instituto Vladimir Herzog evidencia a cultura de violência e impunidade que atravessa gerações em nosso país. Orientados pelas recomendações de aperfeiçoamento do Estado democrático de direito elaboradas pela Comissão Nacional da Verdade e visando finalmente romper com o histórico recente de extermínio de jovens negros nas periferias, ecoamos as vozes que clamam por memória, verdade, justiça e reparação para aqueles que são vítimados duas vezes: pela violência de Estado e pela impunidade.

CNV

A Comissão Nacional da Verdade (CNV) foi um órgão colegiado instituído com o objetivo de investigar as violações de direitos humanos cometidas durante a ditadura militar no Brasil.

Em seu relatório final, apresentado em dezembro de 2014, a CNV concluiu que havia uma política estatal sustentando a prática de detenções ilegais e arbitrárias, tortura, violência sexual, execuções, desaparecimentos forçados e ocultação de cadáveres de alcance generalizado contra a população civil, caracterizando-os como crimes contra a humanidade.

Por fim, a Comissão fez recomendações para o Estado brasileiro com o objetivo de que as práticas criminosas não se repetissem e de que a democracia e suas instituições fossem aperfeiçoadas, em um processo de consolidação democrática.

São 29 recomendações listadas em capítulo específico, além de 13 focadas nas violações de direitos humanos dos povos indígenas e 7 nas violações de direitos humanos da população LGBTQIA+ em capítulos temáticos.

Diante da omissão do Estado brasileiro em cumprir as recomendações, organizações da sociedade civil e o Ministério Público Federal têm se mobilizado para cobrar as respostas há tanto tempo devidas. É nesse intuito que o Instituto Vladimir Herzog criou, em 2019, o Núcleo Monitora CNV, que tem como objetivo monitorar as recomendações e desenvolver ações de incidência para que elas sejam cumpridas.

O Relatório

Este relatório apresenta o monitoramento do estado das recomendações da CNV.

As recomendações foram classificadas de acordo com seu estado de execução a partir do lançamento do relatório final da CNV:

Realizadas

Realizada

Parcialmente realizadas

Parcialmente realizadas

Recomendações para as quais foram identificadas uma ou mais ações positivas que permitem avançar no sentido de seu cumprimento.

Não realizadas

Não realizadas

Recomendações para as quais não se registraram avanços.

Retrocedidas

Retrocedidas

O estado do tema da recomendação é pior agora que ao final dos trabalhos da CNV.

Dados do Relatório

Do total de 29 recomendações, apenas 2 foram realizadas (7%) e 6 parcialmente realizadas (21%), totalizando aproximadamente 28%.

Recomendações Totais

As não realizadas e retrocedidas conformam a maioria de cerca 72%, sendo 14 não realizadas (48%) e 7 retrocedidas (24%).

Recomendacões não Realizadas
Violações de direitos humanos dos povos indígenas

As 13 recomendações feitas no capítulo Violações de direitos humanos dos povos indígenas estão em estado de retrocesso.

Ditadura e homossexualidades

Já as 7 recomendações do capítulo Ditadura e homossexualidades encontram-se como parcialmente realizadas.

Baixe o Relatório

Acesse a íntegra do levantamento sobre o estado de cumprimento de cada uma das recomendações da Comissão Nacional da Verdade.

Fortalecimento da Democracia

Monitoramento das recomendações da Comissão Nacional da Verdade

Media Kit

O caso Jacarezinho

A maior e mais letal chacina da história do Estado do Rio de Janeiro envolveu cerca de 200 agentes da Polícia Civil que, na manhã de 6 de maio de 2021, entraram na favela do Jacarezinho, com quatro veículos blindados e dois helicópteros, e de lá saíram deixando um rastro de barbaridade e violações de direitos humanos, com 28 pessoas mortas.

Oficialmente, a Operação Exceptis era uma ação de inteligência destinada a executar mandados de prisão contra 21 acusados de tráfico de drogas e aliciamento de crianças e adolescentes para atividades criminosas. O que se viu, porém, foi uma soma de ilegalidades, como indícios de execuções extrajudiciais pelas forças policiais, denúncias de torturas, alteração da cena do crime e falta de socorro às vítimas, entre outros problemas que desde então motivaram duras críticas de organizações nacionais e internacionais.
Descumpria-se também uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que proibiu operações policiais desse tipo durante a pandemia, salvo em hipóteses excepcionais e desde que devidamente justificadas ao Ministério Público – que, por sua vez, só seria notificado três horas após o início da operação. O nome da operação não parece ser mera coincidência.

Dois anos depois, a impunidade contrasta com as violações constatadas no território: apenas uma denúncia criminal relacionada à morte de civil teve andamento, enquanto os demais casos investigados foram arquivados ou tiveram denúncia rejeitada, além da ausência de quaisquer políticas de reparação do Estado brasileiro voltadas a vítimas, familiares e moradores da favela do Jacarezinho.

Inclusive, reforçando a violência e atentando contra a memória das vítimas, a própria Polícia Civil destruiu o memorial construído pela comunidade em homenagem às vítimas, sob alegação de que a construção fazia apologia ao tráfico de drogas. Importante mencionar que nenhuma das vítimas foi processada ou condenada pelos crimes que supostamente deram ensejo à Operação Exceptis, afinal foram assassinadas sem possibilidade de defesa.

Também é necessário destacar a ulterior presença permanente das forças policiais na favela do Jacarezinho, sob premissa de implementação do novo programa de segurança pública “Cidade Integrada”, dando ensejo a novos relatos de hostilidade e violência estatal.

O relatório

O relatório Chacina do Jacarezinho, conduzido pelo Instituto Vladimir Herzog, recompõe em detalhes o contexto, os fatos, os erros e os excessos da operação, com a análise de todos os documentos e relatórios disponíveis sobre o caso.

Traz também entrevistas com pessoas chave e relatos comoventes – e revoltantes – de mães e demais familiares que colaboraram com o estudo, além de um conjunto de recomendações da sociedade civil a serem consideradas diante do contexto generalizado de impunidade das condutas policiais ilícitas e do próprio modo de operação das forças de segurança do Estado do Rio de Janeiro, notabilizadas pelo uso excessivo da força, pela política institucionalizada de letalidade e pela militarização dos territórios de favela.

O documento se encerra com um texto sobre a atuação da Defensoria Pública e de sua Ouvidoria, que desde as primeiras horas daquele trágico dia acompanharam a situação de moradoras e moradores do Jacarezinho e os efeitos sobre o território.

Trata-se de um esforço coletivo para denunciar, alertar e reforçar a urgência de que se reverta a inaceitável trajetória de violações de direitos no estado fluminense. Habitualmente enquadradas como “danos colaterais” de operações policiais, é imperativo que execuções sumárias, chacinas e outras formas de violações deixem de se associar ao modus operandi das forças de segurança do Estado.

A política de segurança pública é uma política de garantia e proteção de direitos, e jamais pode ensejar a sua violação. Diante da morosidade e negligência na investigação e responsabilização de violações de direitos cometidas no Jacarezinho, cabe à sociedade civil contribuir para o correto esclarecimento do caso e para a garantia do direito à justiça aos familiares.

Baixe o Relatório

Baixe o relatório e acesse a publicação completa sobre a chacina do Jacarezinho.

Chacina do Jacarezinho

O massacre, a dor e a luta

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