17/03/2021

Rui Xavier

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A pergunta feita foi: em que circunstâncias você assinou o documento? Por intermédio de quem o recebeu, onde trabalhava, que idade tinha etc.

Rui Xavier

“Vladimir Herzog foi assassinado!”

Não conheci o Vladimir Herzog pessoalmente. Em outubro de 1975, quando
ele foi assassinado, eu morava no Rio e trabalhava na sucursal da Gazeta
Mercantil. Nas redações cariocas o sentimento era de absoluta indignação
diante da notícia da forma como ele morreu. Foi assim que eu soube da
existência do Vladimir Herzog. Para nossa tristeza, já cansados de tanto
assistir nosso país sendo massacrado pelos malfeitos dos ditadores da
ocasião, vimos mais um brasileiro decente e digno ser assassinado da forma
mais vil e cruel em um estabelecimento militar.

Levantou-nos um pouco a autoestima o ato ecumênico na Catedral da Sé,
poucos dias depois, organizado por três corajosos e saudosos religiosos – D.
Paulo Evaristo Arns, arcebispo de São Paulo; o rabino Henry Sobel, presidente do Rabinato da Congregação Israelita Paulista; e o pastor James Wright, Presidente da Missão Prebisteriana do Brasil.

Apesar dos esforços do governo de então para evitar que muita gente fosse à Catedral da Sé, lá compareceram cerca de 8.000 (oito mil) pessoas indignada pedindo justiça e punição aos assassinos, o que até hoje (46 anos depois) não aconteceu.

“Vladimir Herzog foi assassinado”, disse Dom Paulo Evaristo Arns, um gigante na defesa dos direitos humanos no Brasil.

O Pastor James Wright também participou com declarações igualmente fortes denunciando a tortura e morte do Vladimir.

É do Rabino Henry Sobel a constatação de que o assassinato de Vladimir
Herzog mudou o país: “Foi o catalizador da abertura política e da restauração da democracia. Esse fato será sempre a recordação dolorosa de um sombrio período de repressão, um eco eterno da voz da liberdade, que jamais se cala…”

De fato, alguns anos depois da morte de Vladimir Herzog o Brasil conseguiu
respirar um ar de democracia, com eleições diretas e as instituições
funcionando.


Mas, desgraçadamente, no Brasil, parece que os infortúnios não querem nunca nos deixar. Em 2016, as forças mais apodrecidas e malcheirosas da nossa política já tinham organizado um golpe destituindo a presidente eleita, dando, então, início a um país onde os poderes da República (Justiça, Legislativo e Executivo) passaram a ser ocupados, em boa parte, por pessoas mal-intencionadas, ladrões e corruptos, que não gostam do Brasil e da nossa gente. Os que não são assim estão acovardados. Infelizmente, poucos, na Justiça e no Legislativo, são os que lutam com competência e sinceridade por dias melhores para todos nós. Enquanto o Executivo reúne um inacreditável exército de paspalhões, raivosos, autoritários, gente sem caráter e malucos.

Um exemplo que podia ser a história de destaque em uma lista de filmes de
horror: o ministro da Saúde de um país de mais de 200 milhões de pessoas,
em plena pandemia provocada por um vírus letal que não tem pena de
ninguém, é um general que se diz especializado em logística. Ele encheu o
Ministério de militares que nada têm a ver com saúde e estão ajudando a fazer uma gestão catastrófica, deixando a certeza de que não sabem o que estão fazendo diante de centenas de milhares morrendo à sua frente.

Quando escrevo essas linhas, 46 anos desse assassinato que marcou mais um triste momento nas nossas vidas, pergunto quando nós, brasileiros, vamos voltar a ser felizes. Sem assassinatos de pessoas boas e honestas, como o Vladimir e tantas outras que não mereciam o destino que tiveram.

17/2/2021.

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