25/10/2021

Luiz Roberto Serrano

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Em fevereiro de 1975, a equipe de jornalistas do semanário Opinião, de oposição ao regime militar, dirigida por Raimundo Pereira, deixou o jornal por divergências com o proprietário Fernando Gasparian, eu, que era correspondente em São Paulo, inclusive.

O semanário passou a ser dirigido, no Rio de Janeiro, onde era sua sede, por Argemiro Ferreira. Em São Paulo quem assumiu a sucursal foi Vladimir Herzog. Nessa circunstância tive um encontro com ele, na sede da sucursal, num prédio da rua 24 de Maio, no Centro da cidade, que era dividida com a da revista Argumento.

No encontro Herzog argumentou a favor de minha permanência. Disse que entendia o afastamento de Bernardo Kucinsky, um dos fundadores do jornal, ferido pelo desaparecimento de sua irmã, provocado pela violência dos porões da ditadura. Eu escrevia para o jornal desde 1973 e fora contratado em 1974, e disse-lhe que, por lealdade a Raimundo Pereira também me afastaria. No início de maio comecei como repórter da Gazeta Mercantil, onde estava Dirceu Brisola, que me antecedera no Opinião em São Paulo, para onde retornara depois de ser editor Nacional do semanário no Rio de Janeiro.

Herzog foi fazer parte da equipe que revolucionou o jornalismo da TV Cultura na época e eu e os jornalistas em geral acompanhávamos os ataques que sofriam por parte do jornalista Cláudio Marques, porta-voz da linha dura militar em São Paulo, no semanário gratuito Shopping News, que circulava bem nos meios políticos da Capital paulista.

Nessa toada a linha dura militar orquestrou uma série de prisões de jornalistas sob a alegação de que eram ligados ao Partido Comunista, vários da TV Cultura e colegas meus do curso de jornalismo da Escola de Comunicações e Artes da USP.

Herzog, uma das vítimas dessa perseguição, infelizmente não resistiu à tortura no Doi-Codi. A versão de que se autoenforcara aumentou a indignação da sociedade civil. Compareci ao velório e ao sepultamento, no qual a atriz Ruth Escobar fez um indignado discurso contra o regime militar.

A cerimônia religiosa ecumênica, dirigida pelo cardeal dom Paulo Evaristo Arns na Catedral da Sé, simbolizou a indignação da sociedade civil paulista contra o crime e a situação política em geral. No dia de sua realização as principais vias de acesso ao Centro de São Paulo amanheceram com carros “quebrados” que dificultavam o trânsito já naturalmente carregado.

A redação da Gazeta Mercantil, que já funcionava em um andar da rua Major Quedinho, 90, compareceu em peso à cerimônia na catedral, depois de receber recomendações de cuidado do diretor de Redação, Roberto Müller. Saindo da igreja pelas portas laterais, depois da cerimônia, era possível ver policiais com máquinas fotográficas registrando quem compareceu.

Meses depois, o metalúrgico Manoel Fiel Filho também foi assassinado no Doi-Codi nas mesmas circunstâncias e os responsáveis também alegaram suicídio. Três dias depois o presidente Ernesto Geisel demitiu o então comandante do II Exército, Ednardo D’Ávila Mello.

Tinha 28 anos quando assinei o abaixo-assinado Em Nome da Verdade, provavelmente em cópia que circulou peça redação da Gazeta Mercantil.

8/6/2021.

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