O Instituto Vladimir Herzog está entre os signatários do Big Tech e Jornalismo: princípios para uma remuneração justa, documento que reúne diretrizes de negociações entre as plataformas digitais e organizações jornalísticas para remuneração de conteúdo.
As diretrizes têm o objetivo de ser universais, servindo como base para qualquer país que busca abordar a sustentabilidade da mídia por meio de concorrência ou abordagens regulatórias, e ao mesmo tempo permitindo adaptações para os contextos locais.
O documento reconhece a liberdade de expressão como um direito humano fundamental que sustenta a democracia e apoia o jornalismo de interesse público como um bem que deve estar disponível a todos. Assim, quaisquer mecanismos que sigam os princípios devem estar fundamentados neste compromisso.
A versão final do texto foi apresentada durante a conferência Big Tech and Journalism – Building a Sustainable Future for the Global South, organizada pelo GIBS Media Leadership Think Tank e realizada nos dias 13 e 14 de julho, em Joanesburgo, África do Sul. O evento reuniu mais de 70 jornalistas, editores de notícias, organizações de mídia, acadêmicos, ativistas, advogados e economistas de 24 países para discutir soluções para a crise da sustentabilidade do jornalismo e sua interseção com o papel das principais plataformas tecnológicas.
Os princípios
1. Interesse público
Os mecanismos devem apoiar e investir no jornalismo de interesse público, ou seja, notícias e informações produzidas de acordo com padrões jornalísticos profissionais que informam o público sobre assuntos relevantes para seus direitos e responsabilidades como cidadãos. Os mecanismos também podem ter o efeito de apoiar outras formas de jornalismo, mas, em igualdade de condições, devem priorizar o apoio ao jornalismo de interesse público.
2. Pluralidade
Os mecanismos devem apoiar a pluralidade nas plataformas e nos mercados jornalísticos. Em especial, os mecanismos devem ter um impacto líquido positivo sobre a pluralidade de organizações em um mercado. Eles não devem criar um viés em favor de organizações estabelecidas, mas devem servir para atenuar qualquer viés que favoreça organizações já estabelecidas, de modo que o público possa – a médio e longo prazo – se beneficiar de uma maior variedade de conteúdo disponível. Organizações muito pequenas, médias e iniciantes devem poder se beneficiar.
3. Diversidade
Os mecanismos devem apoiar a diversidade no mercado jornalístico e devem ter um impacto positivo líquido na variedade de conteúdo, vozes e idiomas representados, incluindo as vozes de grupos historicamente sub-representados e marginalizados. Eles não devem criar um viés em favor de vozes historicamente dominantes.
4. Sustentabilidade
Os mecanismos devem apoiar a sustentabilidade no mercado de jornalismo, para iniciativas individuais e para o setor como um todo, garantindo que eles recebam uma compensação justa pelo uso de sua propriedade intelectual e conteúdo. Os mecanismos devem se adaptar às condições de mercado em evolução e aumentar a probabilidade de que as iniciativas possam criar fluxos de receita diversificados.
5. Equidade
Os mecanismos devem garantir que os termos dos acordos entre plataformas e organizações jornalísticas sejam coerentes com o mercado e não permitam que plataformas específicas ou organizações façam acordos preferenciais. Isso não significa que todas as plataformas devam dar a todas as organizações a mesma quantia de dinheiro. Mas significa que a base para pagamentos e acordos de uso deve ser a mesma para todos nesse mercado e determinada a partir de critérios objetivamente verificáveis. As plataformas não devem favorecer determinadas organizações jornalísticas simplesmente porque elas têm maior influência política ou maior valor de mercado, por exemplo. Isso também significa que todos os acordos entre plataformas e organizações jornalísticas devem ser feitos em prazo igualmente razoável e que nenhuma das partes deve poder usar seu poder de barganha comparativo para arrastar as negociações.
6. Coletividade
As organizações de pequeno e médio porte devem ter permissão para coordenar seus esforços, o que pode incluir negociação coletiva com plataformas.
7. Transparência
O mais alto grau possível de transparência deve ser adotado tanto para o processo de proposição e implementação dos mecanismos quanto para os resultados obtidos. Tanto plataformas quanto organizações jornalísticas devem adotar o mais alto grau possível de transparência para que todas as partes possam avaliar a equidade de qualquer acordo e para que terceiros possam avaliar o impacto do mecanismo como um todo. Por exemplo, os mecanismos podem exigir que as plataformas e as organizações compartilhem dados sobre o tamanho e o comportamento de suas audiências e venda e direcionamento de publicidade. Preocupações com a concorrência ainda podem ser levadas em consideração. Quando houver dados pessoais ou comercialmente sensíveis envolvidos, eles poderão ser compartilhados somente entre as partes e com qualquer órgão de fiscalização. Todas as informações devem ser compartilhadas com o público, quando devidamente agregadas e anonimizadas.
8. Responsabilização
Os mecanismos não devem tolher a liberdade das organizações de responsabilizar as plataformas por suas ações por meio de seu jornalismo, ou a liberdade das plataformas de criticar as organizações de mídia. Os termos dos acordos entre eles devem ser divulgados para garantir que todas as partes possam ser responsabilizadas e para criar uma relação de confiança com o público.
É necessário que avaliadores terceirizados, independentes de qualquer órgão de fiscalização, possam analisar esses mecanismos e seus resultados. Eles devem ter o poder de fazer recomendações a esse órgão e, quando necessário e apropriado, aos órgãos legislativos. Eles devem garantir que haverá oportunidade de consulta pública sobre o desempenho dos mecanismos.
9. Independência
Os mecanismos devem ser supervisionados e ter sua implementação fiscalizada por órgãos que sejam comprovadamente independentes dos segmentos de plataformas e de publicações jornalísticas. Embora esses órgãos possam, quando apropriado, ser estabelecidos e financiados por governos nacionais ou regionais, eles devem ser operacionalmente independentes de influência política e suficientemente bem financiados para mitigar qualquer risco de interferência indevida. Os órgãos de fiscalização devem ter metas e objetivos claros para permitir que o setor, pesquisadores, a sociedade civil e o público determinem se eles estão ou não cumprindo essas metas e objetivos.
10. Resultados
Os mecanismos devem ser orientados para resultados, com os princípios de interesse público, pluralidade, diversidade e sustentabilidade da mídia em seu cerne. Eles devem ser avaliados regularmente por avaliadores independentes, que devem estar em condições de publicar uma análise honesta e robusta do desempenho dos mecanismos.