“Tenho algo a dizer: memórias da Unesp na ditadura civil-militar (1964-1985)” traz quatro ensaios e onze depoimentos sobre o período em que os militares ficaram no poder
Foi realizado, na manhã de 12 de março, na Reitoria, o pré-lançamento do livro ‘Tenho algo a dizer: memórias da Unesp na ditadura civil-militar (1964-1985)”, que traz quatro ensaios e 11 depoimentos sobre o período. Estiveram presentes, o reitor Julio Cezar Durigan, a vice-reitora Mariza Vieira Cunha Rudge, o Secretário Estadual de Educação, Herman Voorwald, e a coordenadora do Centro de Documentação e memória (Cedem) da Unesp, Sonia Maria Troitiño Rodriguez, além de pró-reitores, assessores e integrantes do Gabinete da Unesp.
“Trazer a memória à tona, como faz este livro, é fundamental”, destacou o Secretário. “Este tipo de trabalho resgata a história da Universidade e traz ensinamentos para o futuro”, apontou o reitor Durigan. “Esse tipo de publicação é essencial e se insere entre as principais ações do cedem”, destacou Sonia. “Me identifico muito com a célebre Operação Andarilho, relatada pelo Reinaldo Ayer de Oliveira em um dos depoimentos que constituem o livro”, apontou a vice-reitora Marilza.
A obra, publicada pela Cultura Acadêmica, braço editorial da Editora Unesp, tem como autores Clodoaldo Meneguello Cardoso, Antonio Celso Ferreira, Anna Maria Martinez Corrêa e Maria Ribeiro do Valle. “O apoio da Reitoria da Unesp foi essencial nesta publicação”, destacou Cardoso, que coordena o Observatório de Educação em Direitos Humanos da Unesp. “O trabalho de coleta dos depoimentos foi fascinante e ensina muito sobre a nossa instituição”, completou Maria Ribeiro.
Os ensaios do livro, tratam, respectivamente, de ‘Pelo direito à memória e à verdade na Unesp’, de Cardoso, professor aposentado do departamento de Ciências Humanas da Unesp em Bauru; ‘A universidade nos tempos da Guerra Fria e da Ditadura Militar’, de Ferreira, professor titular da Unesp de Assis; ‘Institutos Isolados, Unesp e ditadura’, de Anna Maria; e ‘Tenho algo a dizer sobre a ditadura na Unesp’, de Maria Ribeiro, professora assistente doutora da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp em Araraquara, também responsável pela entrevistas depoentes.
Os depoentes são: Onosor Fonseca, Ulisses Telles Guariba Neto, José Roberto Tozoni Reis, João Francisco Tidei Lima, Antonio Quelce salgado, Luís Carlos da Rocha, José Sterza Justo, William Saad Hosne, Reinaldo Ayer de Oliveira, Antônio Luiz Caldas Júnior e Luis Carlos Ferreira de Almeida.
Lançamento e debate
O lançamento ocorreu no Centro de Documentação e Memória da Unesp, em SP, seguido de debate sobre o projeto de pesquisa ‘Tenho algo a dizer: memórias da Unesp na ditadura civil-militar (1964-1985)’ (São Paulo: Editora Cultura Acadêmica, 2014), realizado em 2013 e 2014 pelo Cedem – Centro de Documentação e Memória da Unesp e o OEDH – Observatório de Educação em Direitos Humanos, ambos da Unesp. Cardoso, Ferreira e Maria Ribeiro participaram do evento, que contou também com a com a coordenadora do centro, Sonia Maria.
“A obra e, sobretudo, o projeto tem um objetivo de permitir um diálogo entre essa geração que viveu sobre a ditadura civil-militar e os jovens”, explicou Cardoso. “Precisamos fazer uma reflexão ampliada se essa é a democracia por qual lutamos e qual é a que a juventude de hoje quer.”
Para o professor aposentado da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação, Câmpus de Bauru, o livro tem a importância de trazer ao debate público fatos vivenciados nos institutos que formam a Unesp, por professores, servidores e alunos, além da própria formação da Universidade. “Precisamos fazer uma reflexão mais ampliada sobre a própria história da Universidade e da democracia no Brasil”, sentenciou Cardoso. “Temos que conseguir enxergar além dos fatos isolados. Nossa democracia, assim, como a Unesp, são muito jovens e precisam de mais cuidado.”
Na visão do professor Ferreira, da Faculdade de Ciências e Letras, Câmpus de Assis, a obra permite a discussão de qual o papel das instituições de ensino superior no país. A partir de uma análise histórica, as universidades e faculdades tiveram um auge de criação no Brasil, no período que vai de 1940 a 1960. E elas assumiam um papel central na formação de um conhecimento emancipatório para a sociedade e o país.
O golpe militar de 1964 atacou e desmantelou justamente esse projeto político-pedagógico, como da Universidade de Brasilia, idealizado por Darcy Ribeiro e inaugurada dois anos antes. Após o golpe e as reformas da Educação feitas pelo regime ditatorial, as universidades tiveram diversos cursos das humanidades fechados e perderam seu caráter mais crítico, e desassociando-se da própria cultura brasileira, segundo o professor.
Em sua fala no debate do lançamento do livro, a professora Maria Ribeiro, da Faculdade de Ciências e Letras, Câmpus de Araraquara, reforçou os argumentos de Ferreira ao expor fatos ocorridos na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (Fafi), de São José do Rio Preto, teve cursos fechados e professores demitidos e presos, já em maio de 1964, logo no início do governo militar. A faculdade passou a integrar a Unesp em 1976, e teve seu nome alterado para Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas.
A professora coordenou a pesquisa realizada com fontes documentais do Cedem e as entrevistas de professores, ex-professores e ex-alunos da Unesp, gravados durante mais de 20 horas, em áudio e/ou vídeo. O período pesquisado abrangeu acontecimentos ocorridos pós-1964 nos Institutos Isolados de Ensino Superior do Estado de São Paulo, que deram origem à Universidade Estadual Paulista ‘Júlio de Mesquita Filho’, criada em 1976.
Entre as histórias contadas e registradas, Maria destacou duas experiências democráticas vivenciadas pelos institutos da Unesp e rechaçadas pela ditadura. Em 1983, o Câmpus de Assis elegeu o seu diretor de forma direta, com votos de alunos, professores e funcionários. Antonio Quelce Salgado, não pode assumir a diretoria da unidade, deflagrando um movimento de resistência, que culminou com a expulsão de estudantes e a demissão de professores, como o próprio Salgado.
O resgate das memórias dessas lutas do passado subsidia a compreensão do presente e aponta caminhos para o futuro. O momento histórico do país exige reformas importantes socioeconômicas e políticas para garantir um avanço da democracia liberal, ainda muitas vezes formal, para uma democracia social participativa. Somente assim serão garantidos a todos os direitos sociais econômicos e culturais além dos civis e políticos. A Universidade brasileira não pode ficar fora desta luta.
“O livro é também um marco e um legado da história dos indivíduos que se transforma em um documento, que servirá de base para se construir a história da insitutição, e amplia o direito de acesso à informação”, concluiu Sonia, coordenadora do CEDEM.
*Com informações do Portal Universidade