22/05/2018

O jornalismo brasileiro está em luto: morreu Alberto Dines

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Um dos maiores expoentes da luta da imprensa brasileira contra a ditadura, Dines transformou o modo de se fazer jornalismo no país.

Com informações do Jornal do Brasil

Faleceu nesta terça-feira, em São Paulo, Alberto Dines, jornalista, professor universitário, biógrafo e escritor. Dines tinha 86 anos e foi vítima de uma insuficiência respiratória.

Dines foi um dos maiores jornalistas da história do nosso país. Inovador, visionário e transformador, lutou incansavelmente, até o fim da vida, pela garantia do direito à liberdade de expressão e pela formação de jornalistas comprometidos com a verdade e com o interesse público.

Vida
Alberto Dines nasceu no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, em 19 de fevereiro de 1932, filho de Israel Dines e de Raquel Dines, ambos de origem judaica. Fez os cursos primário e ginasial em colé­gios israelitas do Rio.

Em 1943 teve sua primeira experiência jornalística como um dos organizadores do boletim estudantil Horta da Vitória, do Ginásio Hebreu Brasileiro. Cursou o científico no Colégio Andrews.

Carreira
Iniciou sua carreira em 1952 como crítico de cinema da revista A Cena Muda. No ano seguinte foi convidado por Nahum Sirotsky para trabalhar como repórter na recém-fundada revista Visão, cobrindo assuntos ligados à vida artística, ao teatro e ao cinema. Passou a fazer reportagens políticas, cobrindo as campanhas de Jânio Quadros para a prefeitura de São Paulo em 1953 e, um ano mais tarde, para o governo do Estado.

Permaneceu na Visão até 1957, quando foi levado por Nahum Sirotsky para a revista Manchete. Tornou-se assistente de direção e secretário de redação. Após desentendimentos com Adolpho Bloch, demitiu-se da empresa e tentou criar, com recursos próprios, uma revista que não chegou a ser editada.

Em 1959 assumiu a direção do segundo caderno do jornal Última Hora, depois foi diretor da edição matutina e, mais tarde, das duas edições diárias (matutina e vespertina).

No ano seguinte foi nomeado editor-chefe da recém-criada revista Fatos e Fotos, tendo colaborado, nessa ocasião, no jornal Tribuna da Imprensa, então pertencente ao Jornal do Brasil. Em 1960, convidado por João Calmon, dirigiu o Diário da Noite, dos Diários Associados de Assis Chateaubriand, convertendo-o em tabloide vespertino. Deixou o jornal, demitido por Chateaubriand, por não obedecer a ordem de ignorar o sequestro do navio Santa Maria, em Recife, feito em protesto contra a ditadura de Antônio Salazar em Portugal.

Ingressou em janeiro de 1962 no Jornal do Brasil como edi­tor-chefe, aos 30 anos e dez de profissão. Segundo o diretor Manual Francisco do Nascimento Brito, com a entrada de Dines, a reformulação do jornal foi afinal consolidada, pois ele sistematizou as modificações que levaram o Jornal do Brasil a ocupar outra posição na imprensa brasileira.

Ditadura militar
Quando da promulgação do Ato Institucional Nº 5 (AI-5), em 13 de dezembro de 1968, coordenou a edição da célebre primeira página que se valeu de recursos como a previsão do tempo – “Tempo negro. Temperatura sufocante. O ar está irrespirável. O país está sendo varrido por fortes ventos…” – e de um anúncio no alto da página: “Ontem foi o dia dos cegos”, como parte de uma estratégia para denunciar a censura imposta à redação a partir de então, em consequência da nova ordem política autoritária instalada.

Convidado para ser paraninfo de uma turma da PUC logo após a edi­ção do AI-5, fez um discurso criti­cando a censura e, em conse­quência, foi preso em dezembro de 1968 e em janeiro de 1969 e submetido a inquérito. Em 1971, recebeu o prêmio Maria Moors Cabot da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos.

Foi demitido em 1973 do JB, depois de 12 anos como editor. Um dos episódios que marcaram sua passagem pelo jornal foi a cobertura da deposição por golpe militar do presidente chileno Salvador Allende, em 11 de setembro de 1973. Como a censura havia proibido a publicação de qualquer manchete sobre o assunto, Dines coordenou com o diagramador Ezio Esperanza a edição de uma primeira página sem manchete.

Capa do ‘JB’ sem manchete, na morte de Salvador Allende (Foto: Reprodução)

Em 1974 deixou, depois de 12 anos, a Fatos e Fotos, viajando para os Estados Unidos, onde foi professor visitante, durante um ano, na Universidade de Columbia. Retor­nou em julho de 1975 e assumiu a chefia da sucursal carioca da Folha de São Paulo, convidado por Cláudio Abramo, diretor de redação. Em 1980, Dines deixou a Folha de São Paulo, demitido por Boris Casoy, após escrever um artigo denunciando a repressão do governador Paulo Maluf à greve do ABC.

Colaborou, durante todo esse ano, no semanário O Pasquim, onde reeditou a coluna Jornal dos jornais. Nesse período, escreveu a biografia do escritor Stefan Zweig.

Em seguida assumiu o cargo de secretário editorial da editora Abril, em São Paulo. Como diretor-editorial-adjunto, participou da criação de revistas com a Exame de Portugal e instituiu os cursos de extensão e aperfeiçoamento.

Em Lisboa, entre 1988 e 1995, como diretor do grupo Abril em Portugal e consultor editorial da Sojornal ¾ que edita o maior semanário português, o Expresso, e o único vespertino do país, A Capital. Foi também diretor da empresa Jornalistas Associados, que prestava serviços de consultoria no Brasil e em Portugal. Em 1994 criou em Portugal o Observatório da Imprensa. Concluiu e editou a biografia de Antônio José da Silva, o Judeu, e o primeiro volume do livro Vínculos de Fogo.

De volta ao Brasil, em 1994 foi o responsável pela criação do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo da Unicamp. Passou também a escrever, entre agosto de 1994 e setembro de 1995, uma coluna de crítica ao jornalismo na revista Imprensa.

Observatório da Imprensa
Em abril de 1996, lançou a versão eletrônica do Observatório da Imprensa, jornal de crítica e debate sobre o jornalismo contemporâneo, que passou a ter uma edição na TV Educativa do Rio de Janeiro em maio de 1998, e meses depois passou também a integrar ao vivo a programação da Rádio e Televisão Cultura de São Paulo.

Voltou ao Jornal do Brasil em outubro de 1998, onde passou a manter coluna semanal de crítica jornalística. Foi ainda consultor da Grande Enciclopédia Larousse e colaborador de O Estado de São Paulo e do Observador Econômico, de São Paulo. Fez estágios em jornais estrangeiros, como o Daily News e o New York Times, em Nova Iorque; o Daily Mirror, em Londres; o Paris Match e o Paris Jour, na França. Recebeu o título de notório saber em História e Jornalismo da Universidade de São Paulo (USP).

Publicou ainda Vinte histórias curtas (contos, em co-autoria, 1960), Os idos de março e a queda de abril (co-autoria e organização, 1964), O mundo depois de Kennedy (1965), Jornalismo sensacionalista (em co-autoria, 1969), Comunicação e jornalismo (1972), Posso? (contos, 1972), O papel do jornal (1974), E por que não eu? (sátira política, 1979), A imprensa em debate (em co-autoria, 1981), Morte no paraíso – A tragédia de Stefan Zweig (bio­grafia, 1981), O baú de Abravanel: uma crônica de sete séculos até Silvio Santos (biografia, 1990), Vínculos de fogo: Antônio José da Silva, o Judeu, e outras histórias da Inquisição em Portugal e no Brasil (biografia, 1992, volume 1), 20 textos que fizeram história (1992), As transformações da revolução global e o Brasil (1995), Diários completos do capitão Dreyfuss (organizador, 1995).

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