03/02/2015

Diretor executivo do Instituto Vladimir Herzog, Ivo Herzog, concede entrevista à Revista Claudia

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O filho de Vladimir Herzog entra na luta das mulheres que querem mais direitos

Por Patrícia Zaidan, da Revista Claudia

“Aponte um herói que lutou bravamente contra a ditadura militar no Brasil”, provoca o engenheiro Ivo Herzog, 48 anos, tomando o papel da entrevistadora. Respondo com o nome do pai dele, o jornalista Vladimir Herzog, torturado e morto nas dependências do II Exército, em 1975, num dos momentos mais sangrentos da história recente do país. Ele, então, corrige: “Não, o herói é a minha mãe, Clarice, que teve a coragem de enfrentar o regime, passou a criar, sozinha, dois filhos (além dele, o caçula, André) e, apesar das ameaças de morte, recusou a oferta da multinacional em que trabalhava para se mudar do país”. Na época, lembra, ela bancou: “Aqui é meu lugar, vou ficar até conseguir justiça”. A família ainda hoje briga para que sejam processados e punidos os responsáveis pelo assassinato. Com Ivo à proa.

Ele é apaixonado pelo que faz. Tanto que achou pouco seguir como engenheiro formado pela Universidade de São Paulo e mestre em gestão pela americana Michigan State University, com carreira confortável em grandes empresas. Há cinco anos, fundou o Instituto Vladimir Herzog, em São Paulo, do qual é diretor executivo. “Com isso, encerra-se o processo de só falar sobre a morte do meu pai, algo pesado para nós”, explica. “O foco é a celebração da vida, a construção de direitos, de justiça.” Nesse escopo, e com o entendimento de que as mulheres e mães das vítimas da ditadura são personagens de tenacidade e resiliência, Ivo dirigiu as baterias na defesa do gênero feminino. Até porque acredita que a humanidade melhora se as mulheres vão bem. Em novembro de 2014, promoveu o concerto Mulheres… Um Canto de Resistência, que reverenciou aquelas guerreiras, e pretende editar um livro com as principais histórias.

Para maio, prepara o 1º Seminário Internacional sobre a Cultura da Violência contra as Mulheres. Nos dias 20 e 21, o instituto reunirá na capital paulista 15 lideranças, de várias partes do mundo, em quatro painéis. Um deles questionará o porquê de mulheres ainda serem apedrejadas, sequestradas por terroristas, forçadas à circuncisão e a casar ainda crianças. Outro investigará o adolescente: “O que acontece na formação dele para, tão precocemente, considerar normal o homem bater na mulher?”, indaga Ivo. A propaganda e o entretenimento também estarão na berlinda. “Não combateremos o abuso sexual no metrô se a mídia continuar enfatizando que mulher é objeto de desejo.” E será discutido o papel do Estado na criação e no cumprimento de leis que “impeçam esse tipo de poder masculino”. Por fim, será lançada uma cartilha para distribuição em escolas, empresas e praças. “Ela vai atiçar as mulheres com perguntas como: ‘Por que você ganha menos que seu colega de trabalho? Fazer o jantar deve ser tarefa só sua?’ ”

Com mil projetos na cabeça, Ivo montou na ONG um setor que prepara professores para ensinar direitos humanos nas escolas. Criou um prêmio que incentiva jovens jornalistas a perseguir a verdade, recuperou jornais que se opuseram ao período da ditadura, de 1964 a 1985, e fez DVDs com relatos de profissionais que atuaram neles. Não podia agir diferente. “Aos 9 anos, no tumultuado enterro do meu pai e no ato ecumênico que atraiu milhões de pessoas à Praça da Sé, vi que minha vida não seria algo comum”. Há 40 anos ele reitera, todo dia e por onde anda, que o Brasil deve vigiar para que os anos de chumbo não se repitam.

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