30/03/2017

Acadêmicos de destacadas universidades americanas protestaram já em 1975 contra o assassinato de Vladimir Herzog

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Renomados professores de algumas das principais universidades dos Estados Unidos assinaram uma carta em Novembro de 1975 que denunciava as circunstâncias suspeitas da morte do jornalista Vladimir Herzog, que ocorrera um mês antes, e a escalada da repressão militar no Brasil. Publicado na The New York Review of Books, o texto pedia um posicionamento do Congresso americano sobre o apoio dado ao governo autoritário brasileiro e conclamava os intelectuais, líderes religiosos e jornalistas do país a se unirem na luta pela justiça e liberdade.

Veja abaixo o texto original publicado em 1975 e, em seguida, uma tradução do IVH para o português:

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Brasil: o Caixão Lacrado

27 de Novembro, 1975

Aos Editores:

A esta altura, a morte suspeita de Vladimir Herzog, brasileiro de 38 anos, diretor de telejornalismo, jornalista e professor de Comunicação da Universidade de São Paulo, é um assunto de interesse internacional. A história completa sobre como ele morreu permanece a ser esclarecida. No entanto, todas as versões até agora concordam que, três horas após ele se apresentar para interrogatório no quartel-general do Segundo Exército do Brasil em São Paulo, os inquisidores militares o declararam suicida e apresentaram uma confissão assinada — acima de uma assinatura reconhecidamente ilegível —significando sua filiação ao Partido Comunista. No dia seguinte, 26 de Outubro, o comando do Segundo Exército liberou o corpo de Herzog em um caixão lacrado, impedindo a visão da família e do público, e ordenou um sepultamento às pressas e, aparentemente, sem o benefício da liturgia judaica.

Menos conhecidas, entretanto, são três questões relacionadas à trágica morte de Herzog. Juntas, elas levantam a questão se o Brasil está prestes a descer pelo sinistro caminho já trilhado pela junta chilena.

Primeiro, a mobilização espontânea de pessoas justamente indignadas em São Paulo interrompeu uma das potencialmente mais extensas caças às bruxas na memória recente. Não a lei brasileira, mas a greve de 30 mil estudantes e professores universitários por uma semana, a reunião do Sindicato dos Jornalistas em sessão permanente, e a celebração pública de um serviço memorial ecumênico na catedral católica de São Paulo produziram garantias momentâneas para a segurança física de outros dez jornalistas presos. Também chamou a atenção pública para o destino de outros 81 presos políticos e extraiu do governo federal a promessa de permitir um inquérito público sobre a morte de Herzog.   

Em segundo lugar, apesar das políticas conciliatórias do presidente do Brasil, general Ernesto Geisel ao longo dos últimos dezoito meses e da restauração de algumas garantias legais, grupos de militares linha-dura, concentrados principalmente, mas não exclusivamente, em São Paulo, e alinhados a interesses nacionais e estrangeiros, continuam a exercer um papel central nos assuntos da nação. Depois da morte de Herzog, fontes militares autorizadas anunciaram publicamente “uma escalada na repressão” e uma “luta implacável contra os agentes da ação subversiva”. Além disso, a alta incidência de jornalistas judeus entre os recentemente presos pode ter implicações anti-semitas. O que está em jogo no resultado do processo Herzog, então, é se a facção militar corporativista dentro das forças armadas brasileiras conseguirá maior controle político ou se os esforços para um retorno gradual às liberdades civis ainda são viáveis.   

Finalmente, a cumplicidade americana após o golpe de 1964 ajudou a pôr em movimento uma década de governo autoritário, assim como o silêncio oficial dos EUA diante da repetida repressão deve compartilhar a culpa pela erosão dos direitos humanos. O Congresso [americano] deve questionar seriamente o uso de dólares dos impostos com regimes que violam sistematicamente os direitos humanos; enquanto os intelectuais, líderes religiosos e jornalistas americanos devem cuidar para que a morte de Herzog dê nova vida à luta comum pela justiça e liberdade.

Richard Morse, Professor de História, Yale University

Thomas Skidmore, Professor de História, University of Wisconsin, Madison

Alfred Steppan, Professor Associado de Ciência Política, Yale University

Stanley Stein, Professor de História, Princeton University

Charles Wagley, Professor de Pesquisa de Pós-Graduação em Antropologia, University of Florida

 

CLIQUE AQUI PARA LER O ORIGINAL EM INGLÊS

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